Dorgival Viana Jr

Introdução

Neste artigo, vou buscar explicar de modo simplificado a sistemática de fixação de honorários em ações contra a Fazenda Pública, indicando o que a Lei diz e qual foi o critério utilizado pelo Superior Tribunal de Justiça para afastar a literalidade da lei.

Honorários advocatícios na sucumbência da Fazenda Pública. Regra inserta no Novo CPC

Muitos advogados, principalmente os que atuavam em desfavor da Fazenda, reclamavam bastante do tratamento quase tutelar oferecido aos entes públicos.

O argumento era simples: alegavam que os juízes não observavam os princípios da proporcionalidade, grau de zelo, complexidade do trabalho, limitando-se a condenar a Fazenda Pública em valores por vezes irrisórios. Já vi, por exemplo, condenação correspondente a 0,001% do valor da causa (condenação de 20 mil reais em causa de 20 milhões).

O STJ já adotava o entendimento de que lhe era possível, em Recurso Especial, alterar honorários advocatícios em casos tais que estes se revelassem irrisórios ou excessivos.

A Fazenda, por sua vez, sustentava que a desvinculação aos parâmetros usuais de honorários advocatícios (10 a 20%) era uma forma de proteger o erário, haja vista que a sucumbência, tal qual a condenação principal é paga com verba pública, devendo sempre ser adequada à complexidade do feito.

Várias vezes, uma causa juridicamente ser considerada simples, mas pode ter impacto financeiro bastante elevado, notadamente em causas tributárias.

Os argumentos, das duas partes, tiveram ressonância no legislador que adotou uma postura intermediária, estabelecendo critérios objetivos para as condenações da fazenda ao tempo em que não a jogou na “vala comum”.

Os critérios previstos na legislação são os seguintes (dispositivos do CPC-2015):

Art. 85, § 3º Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais:

I – mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários-mínimos;

II – mínimo de oito e máximo de dez por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 200 (duzentos) salários-mínimos até 2.000 (dois mil) salários-mínimos;

III – mínimo de cinco e máximo de oito por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 2.000 (dois mil) salários-mínimos até 20.000 (vinte mil) salários-mínimos;

IV – mínimo de três e máximo de cinco por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 20.000 (vinte mil) salários-mínimos até 100.000 (cem mil) salários-mínimos;

V – mínimo de um e máximo de três por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 100.000 (cem mil) salários-mínimos.

Destaco que, em caso de condenação líquida, o valor dos honorários deverá desde logo fixado, bem como que o valor do salário mínimo a ser considerado para esses percentuais é o vigente no momento da prolação da sentença ou liquidação dos valores.

As faixas de honorários advocatícios acima mencionadas são aplicáveis progressivamente, ou seja, se ultrapassar uma das faixas, é aplicável o valor daquela faixa até o máximo e as seguintes proporcionalmente e de forma sucessiva.

Interpretação do STJ

O Superior Tribunal de Justiça abriu espaço para aplicação mitigada deste dispositivo ao expandir uma exceção ao art. 85, §3º do CPC que está já em seu §8º, pois vejamos:

Art. 85, § 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.

Deu a lei liberdade para o julgador apenas nas hipóteses de valor da causa muito baixo ou proveito econômico irrisório ou inestimável.

Todavia a primeira e segunda turmas do Superior Tribunal de Justiça já adotaram o entendimento de que a consequência de a lei ter permitido apreciação equitativa de honorários ao proveito econômico irrisório deve ser estendida para aquelas em que proveito econômico é exorbitante, mediante análise do caso concreto.

Isso para permitir fugir, quando quiserem, dos critérios rígidos do CPC.

Em caso recente, foi considerada justa a condenação em honorários de R$ 100.000,00 em uma ação de 21 milhões, ou seja, por apreciação equitativa os magistrados julgaram válido o arbitramento de honorários de 0,48% do valor da causa (REsp nº 1864345 / SP).

Minha opinião

Embora seja certo que este posicionamento caminhe para formar uma possível jurisprudência em breve, acredito que não deveria tal posicionamento prosperar.

Primeiramente, os parâmetros matemáticos servem para balizar a própria decisão de ingressar ou não na justiça, isso dá previsibilidade às consequências econômicas de, por exemplo, perder uma demanda.

Segundo, as decisões da primeira (REsp 1771147/SP) e segunda (AgInt no AREsp 1487778/SP) turmas do STJ deixaram de aplicar preceito normativo expresso sem declarar sua inconstitucionalidade, mas afastando sua incidência, o que deveria exigir a manifestação do órgão especial na forma do art. 97 da CF88 e Súmula Vinculante 10 do STF, esta última transcrevo:

Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.

Não encontramos nenhuma decisão da Corte Especial do STJ que afaste a incidência do art. 85, §3º do CPC-2015 nos casos em que o proveito econômico é exorbitante, motivo pelo qual entendemos que o dispositivo é aplicável.

De igual sorte, não serve a este parâmetro a jurisprudência de antes da edição do Novo CPC, vez que, por óbvio, não levou em consideração seu texto.

A OAB também tem discordado do posicionamento do STJ.

Conclusão

Apesar da minha discordância, certo é que há precedentes importantes do STJ no sentido de que se aplica o arbitramento de honorários contra a fazenda pública por equidade nos casos em que o proveito econômico é “exorbitante”, razão pela qual se mostra plausível sua invocação na lida diária caso tal tese lhe seja adequada.

Sou totalmente contra afastar incidência de ato normativo claro sem que haja a análise de sua constitucionalidade, vez que, em tese, isso permitiria uma margem interpretativa excessivamente ampla em área que o legislador quis tornar previsível para as partes na fixação dos honorários advocatícios de sucumbência nas ações com participação da Fazenda Pública.

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